Vamos vestir Magritte

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Expressar-se artisticamente livre do controle do pensamento. Criar sem se ater a padrões estéticos ou morais. Compor novas formas de modo que o funcionamento do pensamento venha à tona, fazendo ver suas contradições, falta de lógica, bizarrices, seus elementos surreais. Fazer dos sonhos material de trabalho. Produzir uma arte que não seja escrava da racionalidade e dos padrões vigentes.

Estes eram alguns dos princípios do surrealismo, movimento artístico encabeçado pelo poeta, crítico e psiquiatra francês André Breton, na década de 20. Fortemente influenciado pelas inovadoras idéias de Freud – o qual considerava os sonhos a via régia de acesso ao inconsciente -,  o surrealismo enfatiza o papel do inconsciente na atividade criativa, propõe que o fazer artístico seja realizado em estado de automatismo psíquico – ou associação livre – buscando atingir uma realidade superior, descrita como “maravilhosa” no Manifesto Surrealista de 1924.

O surrealismo foi fortemente influenciado pela psicanálise. Salvador Dali, Luis Buñuel, Max Ernst, Antonin Artaud e outros artistas criavam formas que deixavam ver que a riqueza do pensamento humano, que vai muito além do que costumamos dizer ou mesmo pensar que pensamos. Mas, e se a estética proposta pelos surrealistas invadisse o campo da moda? Como fazer ver o funcionamento inconsciente nas roupas, nas composições, naquilo que adorna o corpo? Como fazer a corpo sonhar? Como sonhar com as roupas estando acordado?

O fotógrafo Andrew Matusik inspirou-se em Magritte e fez um belo ensaio para a Revista Genlux, no inverno de 2008. O resultado é muito interessante, associando a elegância ao Estranho. Ontem, em nosso Look do Dia com Arte, nos inspiramos em uma das fotos deste ensaio. Hoje trago, para vocês, mais fotos do editorial. Afinal, é impossível pensar moda sem sonho e este sonho não precisa, necessariamente, ser o da princesa e seus sapatinhos. Podemos extrair formas mais complexas, únicas, bizarras da dimensão onde realmente somos e nem pensamos.

Observação: atenção para os penteados!

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Processo de composição. Da inspiração em Magritte à foto do editorial:

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Preto e branco bombaram no ensaio. Maravilha!

A proposta do Vestido de Letras vai de encontro à deste editorial: se inspirar em fontes interessantes, incluir novas formas em seu modo de se colocar no mundo. O surrealismo é um bom ponto de partida, de abertura.

Espero que tenham gostado. Boa quinta-feira!

Beijos,

Júlia

Look do Dia com Arte:
cores e letras de Frida Kahlo

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O corpo se compõe de laços de fita, sonhos e memórias felizes, brincadeiras de boneca, passeios de mãos dadas, danças rodopios e vestido rodado. Se acaricia com delícias e guarda o “para sempre” da infância. Mas o corpo também se faz de dor, desconforto, estranheza e limitações (#quem nunca?). O corpo é estranho e estrangeiro, fala uma língua que exige tradutores. Temos que inventar – cada um de um modo – modas com/para nossos corpos. Precisamos costurar vestidos e moldar contornos para o corpo, para diluir o amargor que, em cada vida, tem fórmula, densidade e gosto singulares.

Alguns encarnam o sofrimento de forma mais intensa e, assim, encaram mais de perto os impasses que um corpo pode colocar. Seja por obra do destino ou do desejo, um sujeito pode ter que “dar nó em pingo d’água” para criar seus laços de fita. E é daí que surgem invenções de moda incríveis, inesperadas, potentes. A beleza viva brota do extremo. Frida Kahlo – a artista mexicana de traços fortes e olhar marcante que estampa o retrato acima – conseguiu, através de seu gesto artístico e de suas cores, transformar seu amargor em flor, oferecendo ao mundo um universo de cores e letras intensas e extremamente femininas. Uma bruta flor do amor.

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Frida Kahlo parece pintar com cores que escorrem de seu pulso. O corpo aparece com toda força nas obras da artista cuja vida foi marcada por impasses: contraiu poliomielite aos seis anos de idade, ficou em cima de uma cama por nove meses e ficou com sequelas. Aos dezoito anos foi vítima de um grave acidente em que o ônibus no qual se encontrava colidiu com um carro. As sequelas desse acidente foram ainda mais graves. Ela passou a ter dores fortes e constantes e, de tempos em tempos, fazia tratamentos em que precisava permanecer imobilizada. Mas, justamente diante do imperativo de “parar”, ela deu (como pôde) um “pulo” de vida na vida e lindamente fez jorrar suas cores e dores no mundo.

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Como no dia 06 de julho comemoramos o aniverário de Frida Kahlo – uma artista cuja obra me toca desde cedo (contarei o porquê no próximo post), resolvi fazer uma semana temática. Todos os looks desta semana serão inspirados na figura e na obra de Frida. Ah! Nesta semana teremos três looks! O de hoje foi inspirado na foto que abre o post. O olhar de Frida é, ao meu ver, o núcleo e o coração da foto. Em torno desse olhar, adereços coloridos e jóias em prata. Adepta da tendência étnica (que está super em alta!), a estilosa Frida gostava de se enfeitar com elementos que remetiam à cultura e às tradições de seu país natal: México.

Para compor o meu look com Frida, parti das cores fortes de sua blusa e do laço de fita que enfeita seu cabelo. Azul e rosa choque são cores marcantes que formam uma combinação viva-contraste. Na blusa de Frida catei a flor, que foi a “chave” do ensaio fotográfico. Escolhi uma calça (que adoro) com estampa étnica, fazendo uma referência à cultura indígena. Dobrei a barra da calça porque acho que fica mais charmoso e alonga as pernas (sou mignon). A blusa com laço remete ao adereço que enfeita a trança da pintora. O sapato  que escolhi tem um toque artesanal (nas cordas). Se “viajarmos na maionese” podemos ver que o cinto remete às pirâmides mexicanas (#forçando a barra com Frida Kahlo. haha). Quanto à bolsa, achei que ela dava um toque mais moderno ao look que, no fim das contas, ficou bem atual. Concordam?

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bolsa

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pose

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flor_4 Blusa: Luisa Accorsi (recomendo!)/Calça: Pop Up Store/Cinto: Zara/Sapato: Arezzo/Bolsa: comprada em viagem

Fotografia: Carolina Homem

Aproveito para indicar a leitura de O Diário de Frida Kahlo: um auto-retrato íntimo. É um livro-exposição que traz os escritos de Frida entremeados aos seus desenhos. É de uma beleza e de uma intensidade fora do comum. Uma obra de arte. Vale a pena procurar.

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Espero que tenham gostado deste retalho do nosso Vestido de Letras.

Aguardem! Vem mais por aí!

Aproveito para agradecer pelos comentários que vocês têm deixado aqui, costurando nosso vestido com as cores de suas letras. Fico muito satisfeita ao ler cada mensagem.

Beijos,

Júlia

Primeiro passo: o texto

A Clarota me passou essa incumbência de escrever os “dez passos para ser uma moçoila sexy”. Morri de rir. Nunca, nunquinha na vida imaginei que alguém pudesse me pedir isso. Mas, como recuar? Se não sei bem o que escrever/dizer/fazer nesse sentido,  não pude parar de pensar nisso desde então. Já estou escrevendo, atendendo ao pedido. Aguardem (risos). Mas preparem-se, porque também quero ouvir os dez passos de cada uma. Claro! Isso aqui é um troca troca.

Quando me deparei com a puberdade, me fazia essas perguntas: “o que é sexy?”“como faço para ser sexy?”. Naquela época, comecei a dar um jeito de comprar revistas da Playboy em busca da resposta nas imagens. Outro movimento foi a busca de respostas na literatura, principalmente na literatura erótica. Li “A Delta de Vênus”, de Anïs Nin. Foi interessante. Ela ressalta um feminino forte, ativo. Outros movimentos se seguiram. Mas sempre considerei a literatura e o vinho (principalmente quando combinados) a principal fonte de inspiração… rumo à languidez (né, Fê?!).

Por isso, trago, hoje, um texto meu, que escrevi com base em textos de Marguerite Duras e Santo Agostinho ( valendo-me do corte e recorte mesmo, roubando trechos e remendando). Fiz trabalho de costura de textos, arremate, criação. Adoro fazer isso. Trabalho de citação, de depuração, de apuração. Especialmente quando os textos são fulgurantes e gozam, como os desses escritores.

Gravei esse texto com o apoio da Rádio UFMG, como parte de uma atividade de uma oficina do Festival de Verão de…2011, se não me engano. Tenho tentado trabalhar a leitura, interessada pelo “grão da voz”. Por isso, o texto em forma de áudio.

Quero ouvir vocês também.

Beijo,

Júlia

 

MIGALHAS LITERARIAS – JULIA – PROGRAMA 2 – TERCA